sábado, 9 de abril de 2011


Existem pessoas que colocam palavras nas nossas bocas. Que nos fazem descrever sentimentos, mesmo que essa descrição seja pálida e fosca em comparação com a intensidade das sensações. Elas não são poetas. Às vezes, elas nem suspeitam de tal manuscrito. Elas não são o papel, ou as falanges que seguram a caneta, elas não são sequer a caneta... são a tinta. As letras. O som inaudítivel das ilusões caladas. É o amor abstrato transformado em rabisco onde o autor lê para ter alguma coisa que contemplar. Mas, depois, de súbito, essas pessoas nos deixam. Pé ante pé. Sem alarde. No momento mais eufórico. Quando estamos correndo e dando pulinhos enganados. Elas vêm e te dão uma rasteira. E você só fica com os olhos e o coração inchado. É a única coisa que elas te deixam. Elas levam a sua voz. Sua escrita. Seu papel. Sua leveza. Suas cores bonitas do mundo.

Decepcionamos e tentamos apagá-las dentro de nós. Deixam de ser caras. Tiramo-nas dos pedestais. E por tudo que se sonhou, elas não podem ser catalogadas a partir desse momento na categoria de amigos. Partem. Têm que parti. As colocamos numa Terra de Ninguém. Bem perto do Gênio da Lâmpada, da Fada do Campo, dos duendes, gnomos e Papai Noel. Terra onde ficam todas as ilusões que te encantou um dia. Ficam por lá. Mais ou menos errantes. Mas, sempre fortes e esparsamente lembradas. Porque o que você não viveu tem muita força.
Essas pessoas que já foram tanto se transformam em meros fantasmas ou silhuetas difusas, ou em estrelas cadentes que cruzam despercebidas nossos corações já remendados, mas que às vezes, nem causam mais calafrios. Não sabemos o que elas se tornaram na Terra Ninguém. Não são amigos. E não são mais amores. Estão numa espécie de museu onde por fatalidade não saem nunca. E que você na sua loucura ainda tem a mania masoquista de ir para a visitação freqüentemente. Como uma arqueologia de sentimentos não resolvidos. Elas estão lá. Mesmo que em meras representações. Em pequenos retalhos de lembranças. As pessoas ficam lá nesse museu sinistro e eterno.
Porque no fundo você sabe que os amores que realmente duram...são os impossíveis... psicose desses pequenos empoeirados pedaços de histórias inconclusas se agarrarem no nosso coração. Os sentimentos pelas pessoas que já ocuparam a sala mais ampla dele, quando perderam a magia, desculpa, quando MATARAM a magia, são destinadas a um pedaço de terra lá nos confins desse órgão. Essa terra é uma espécie de cemitério. Vamos chamá-lo de cemitério dos poetas.
Esse cemitério é um lugar cinzento. Cheio de nervura do imaginário. Com monumentos tombados ao amor que lá está enterrado. Às vezes, enterrado vivo. Nas paredes do mausoléu, telas pintadas com pinceladas coloridas para celebrar os primeiros suspiros de amor. Uma ária suave para um lugar tão triste, como uma cantiga de ninar nas cinzas do fim do mundo. Tudo isso para embalar o que foi morrendo dentro de nós. Assusta. Assusta saber que mora dentro da gente alguém que tenha ajudado a matar de inanição quem trouxe a poesia.
Jaz aqui o amor. Enterrado vivo. Não foi feliz. E misericordiosamente, você jogou as pás de terra.
Hoje eu sei que esse sentimento só merece uma lápide. E quem sabe, uma oração para que ele descanse em paz. Não merece uma história escrita ou epitáfio. Tudo seria tristíssimo. Adorno sua sepultura com flores negras do tédio. E lanço um último sorriso. Sorriso de renúncia diante do impossível.

Nenhum comentário:

Postar um comentário